Grind também é alegria!
A agonia sonora transmite uma identificação sem palavras; o tremor do corpo diz por si só. Sensações talvez estranhas e inusitadas quando ditas fruto de vozes caóticas e indecifráveis, se julgadas consequência da intensidade que uma simples (não que isso seja pouco, porque não é) banda pode transmitir. É uma perspectiva completamente pessoal, mas forço o questionamento a quem já viu de perto: como explicar o DER?
DER, Verdurada, 2009.
Pra muita gente é só barulho, pra outros tantos é uma máquina humanamente desumana de produzir blast beat, mas pra mim soa próximo da agonia e do espasmo que as cicatrizes da vida espalham pelo corpo de quem sofre, seja lá qual for a dimensão ou o porquê do seu sofrimento. Não é só a explosão de decibéis, não é só velocidade, não são só quatro amigos querendo tocar rock; é um grito agonizante que clama por justiça e igualdade, mas, por entender a deplorável natureza humana, não espera absolutamente nada em troca. “O que fazer? O que fazer? Com nós mesmos, o que fazer?”, são as frases que desfecham a música “Mar de Pequenas Cobras”, um tiro sobre a angústia que a insegurança e a falta de perspectiva trazem a quem estagnou pela sucessão de memórias amargas. E olha que nem é preciso entender a letra pra se dar conta disso; quem já viu ao vivo que diga, o quão comovente é a “performance” espontaneamente doentia, asfixiante, negativa, densa e terrivelmente introspectiva do vocalista Thiago Nascimento, e que diga mais, sobre o quanto essa vista é impactante e pesada. Não agrada, não faz rir (talvez o cofrinho te faça, mas isso é o de menos), te agride e faz pensar sobre o que ocupa aquela mente enquanto dominada por um microfone na mão. A personificação da raiva de espírito e mais um pouco é o meu palpite.
Já presenciei o espetáculo do horror por 5 vezes, e é sempre o mesmo sentimento indecifrável, a mesma loucura transbordando em choro, arrepios e mais arrepios. Outro agravante (e que agravante!) é a presença do Barata, o que não desvaloriza os outros três mas sobressai porque é o maior prazer do mundo ver o cara tocar. É um show a parte, estimula meu misto de prazer com desconforto, porque é tanta coisa feita com uma dimensão de técnica e facilidade que espanta. Nesses 5 que vi fui dar um aperto de mão no cara, sempre com aquela impressão meio demente de “caralho, esse sujeito é de verdade?”, e não só era, como se mostrava muito humilde e tranquilo. Gente da gente.
Bom, toda excreção de sentimento por uma banda de barulheira tem motivo: ouvi mais cedo, umas três vezes seguidas, o lado do DER no split com o Aberrant. Já havia ouvido uma vez, mas acho que não tava no clima pra perceber a dimensão do problema. Escrevo besteira como desabafo, um desabafo de gratidão que não chega o mínimo à altura do que essa banda simboliza pra mim, mas que é o meu único meio de dizer um muito obrigado com mais intensidade e afeto. “Quando a esperança desaba” foi um disco que mudou minha vida, assim como ver o DER ao vivo também mudou muita coisa em mim, desde o Júlio baterista até, principalmente, o Júlio pessoa. Odeio ter que trabalhar, odeio servidão, odeio ter que sofrer e odeio ter que lutar contra tudo isso sem muita perspectiva, mas agradeço pelo prazer ao ódio que sinto quando escuto/presencio algo tão intenso assim.